No princípio era a palavra.
Daí veio a dor, o desejo, a saudade e o verso.
Poema verdadeiro pra ser de mentira tem que ter um pouco
de tarde nas suas margens, um pouco de preguiça no seu egoísmo e um pouco de
Deus nas suas pétalas.
Do outro lado da pétala tem um velho sentado que liga o
rádio pra ouvir o quando.
Nele (no quando), o velho enxerga a voz rouca dos carros
que passam na rua e sente o cheiro vazio dos passos acelerados da cidade.
Ele tinha princípios harmônicos sem limites de vento.
Enxergava o após sem o antes e nos seus ouvidos a
natureza sussurrava uma melodia boreal de lágrimas.
Ele era como um pescador relaxado de premissa e lamúrias.
O velho da pétala tinha no seu abandono uma vocação
esquecida de chuva.
Carregava no bolso uma foto quase apagada de pessoas que
não eram e um livro ébrio com poemas de amor com soluços e de angústias presentes
que sofriam de aurora.
Seus versos molhavam de desapego a amarga dor de quem os
ouvia e tatuava de fascínio a esperança solitária dos que por ele passavam.
Dava pra ver o silêncio fazer pegadas nas páginas do
velho.
Havia uma ansiedade lapidada de tempestade e ruínas no caminho
do velho.
Ele cantava um hoje impossível de flores com crianças em
roda.
Dava nome ao suspiro, apelidava os minutos.
Limpava seu coração de nuvem com plumas brancas de
inventar.
E na pétala vazia de infinito, amor e descobertas o velho a
sorrir morria em casulo.